sexta-feira, 27 de maio de 2011

CONTO: PALAVRAS ALADAS

UM CONTO PARA LER, SE ENCANTAR E  REFLETIR SOBRE O PODER DAS PALAVRAS...

                                                   

"Silêncio era a coisa de que aquele rei mais gostava. E de que, a cada dia, mais parecia gostar. Qualquer ruído, dizia, era faca em seus ouvidos.

Por isso, muito jovem ainda, mandou construir altíssimos muros ao redor do castelo. E logo, não satisfeito, ordenou quepor cima dos muros, e por cima das torres, por cima dos telhados e dos jardins, passasse imensa redoma de vidro.
Agora sim, nenhum som entrava no castelo.O mundo podia gritar lá fora, que dentro nada se ouviria. E mesmo a tempestade fez-se muda, sem que rolar de trovão ou correr de vento pertubassem a serenidade das sedas.
-Ouçam que preciosidade!- dizia o rei. E toda a corte se calava ouvindo embevecidamente coisa alguma.
Mas se os sons não podiam entrar, verdade é que também não podiam sair. Qualquer palavra dita, qualquer espirro, soluço, canto, ficava vagando prisioneiro do castelo, sem que lhe fossem de valia fresta de janela ou porta esquecida aberta. Pois se ainda era possível escapar às paredes, nada os libertava da redoma.
Aos poucos, tempo passando sem que ninguém lhe ouvisse os passos, palavras foram se acumulando pelos cantos, frases serpentearam na superfície dos móveis, interjeições salpicaram as tapeçarias, um miado de gato arranhou os corredores.
E tudo teria continuado assim, se um dia, no exato momento em que sua majestade recebia um embaixador estrangeiro, não atravessasse a sala do trono uma frase desgarrada. Frase de cozinheiro que, sobrepondo-se aos elogios reais, mandou o embaixador depenar, bem depressa, uma galinha.
Mais do que os ouvidos, a frase feriu o orgulho do rei. Furioso, deu ordens para que todos os sons usados fossem recolhidos, e para sempre trancados no mais profundo calabouço.
Durante dias os cortesãos empenharam-se naquele novo esporte que os levava a sacudir cortinas e a rastejar sob os móveis(...) Enfim, divertiram-se tanto, tão entusiasmados ficaram com a tarefa, que acabaram por instituir a Temporada Anual de Caça à Palavra.
De temporada em temporada, esvaziava-se o castelo de seus sons, enchia-se o calabouço de conversas. A tal ponto que o momento chegou em que ali não cabia mais sequer o quase silêncio de uma vírgula. E o Mordomo Real viu-se obrigado a transferir secretamente parte dos sons para aposentos esquecidos do primeiro andar.
Foi portanto por acaso que o rei passou frente a um desses cômodos. E passando ouviu um murmúrio, rasgo de conversa. Pronto a reclamar, já a mão pousava na maçaneta, quando o calor daquela voz o reteve. E inclinado à fechadura para melhor ouvir, o rei colheu as lavas, palavras, com que um jovem, de joelhos talvez, derramava sua paixão aos pés da amada.
A lembrança daquelas palavras pareceu voltar ao rei de muito lonte, atravessando o tempo, ardendo novamente no peito. E cada uma ele reconheceu com surpresa sua própria voz, sua jovem paixão. Era sua aquela conversa de amor há tantos anos trancada. Frio da longa meada do passado, vinha agora envolvê-lo, religá-lo a si mesmo, exigindo sair de calabouços.
-Que se abram as portas!- gritou comovido, pela primeira vez gostando do seu grito, ele que sempre havia falado tão baixo. E escancarou os batentes à sua frente.
-Que se derrube a redoma!-lançou então o rei com todo o poder de seus pulmões. -Que se abatam os muros!
E desta vez vai o grito por entre o estilhaçar, subindo, planando, pássaro-grito que no azul se afasta, trazendo atrás de si em revoada frases, cantigas, epístolas, ditados, sonetos, epopéias, discursos e recados, e ao longe- maritacas-um bando de risadas. Sons que no espaço se espalham levando ao mundo a vida do castelo, e que, aos poucos, em liberdade se vão."
MARINA COLASANTI




7 comentários:

  1. Achei o texto muito enteressante,pois fala de como as palavras podem se movimentar mesmo estando presas.

    Aluna:Roane Pereira Queiroz

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  2. ''Eu achei esse conto muito enteressante, pois percebemos que as palavras forem criadas para serem livres não para viver presas ...''

    Aluna: Ingrid Duarte

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  3. Achei o texto muito bom, ele mostra como as palavras não podem ficar presas, mostra tambem que as palavras foram e são criadas para serem livres.

    Aluna: Amanda Siqueira

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  4. Me identifiquei muito com o texto. Pois, eu consegui ver a importância das palavras em nossas vidas... E que não é possível prendê-las, porque elas são livres!
    By: Nathalya Siqueira

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  5. achei muito enteresante pois as palavras não forao feitas para ficar presas e sim para serem livres
    nome: yuri henrique

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  6. achei o texto muito legal pq acho q as palavras denvem ser livres


    nome: mathias curty

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  7. Achei esse conto fantástico um máximo, alem de no dia ter achado super complicado, pois foi a primeira aula com contos fantásticos.

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